13 de novembro de 2011

Olha como chove Lisboa

Há, com toda a certeza, razões e porquês para tudo o que vês.
Na verdade, tudo o que somos se baseia na tentativa frustrada que lançamos rumo ao entendimento.
Tudo. O que é o tudo? De que é feita a totalidade da matéria? De que é composta? 
Para onde se caminha quando já não se quer nada mais do que aquilo que na verdade já se tem?
E o oposto? A que categoria pertence ele?
Onde se encaixa alguém que não tem nada e que quer desesperadamente alcançar... qualquer coisa que seja?
Já não digo tudo, mas digo, qualquer coisa que seja, é mais simpático, mundano, modesto e não obedece à estúpida luta de classes a que vulgarmente se assiste no dia vai, dia vem.
Talvez ser poeta seja de facto ser mais alto.
Se para ser mais alto tenho de escrever, então não pararei de crescer.
Contudo, lá está o tudo novamente, amanheço debaixo da chuva que hoje cai e penso no que me falta?
E no que faltará então aos que de facto assumem ser e não ter nada.
Lá dizia o "outro", que "só sei que nada sei", eu por mim mesmo digo apenas que "não sei o que sabe que nada tem".
Andamos em versos descalços, caminhamos por estradas cobertas de um magma invisível que segrega a consciência dos fracos, ou simplesmente faz bolhas nos pés de quem não calça os caminhos que percorre.
Na calçada as pedras andam também elas perdidas, porque alguém as deixou assim.
Por elas passamos todos e passa de tudo um pouco e tanto mais.
E o que têm as que não têm a sorte de formar composições gráficas embelezadas, a que alguém ousou chamar de calçada portuguesa?
Todas as outras que vivem de uma só cor e são erigidas às três pancadas, mais não são que um aglomerado de pedras soltas, que tantas vezes nem se chegam a tocar.
Lá fora rebentam granadas temporais, cavilhas soltas ao desbarato, por uma natureza enfurecida que tem a ousadia de fazer soar os alarmes dos carros, que acordam os vizinhos, que resmungam contra o tempo, lá está a luta de classes.
O tempo é o que é e faz o que faz, e quem nos julgamos nós para praguejar contra os seus desígnios.
Mais uma granada para a mesa do canto, por favor. Qual? A que tem o senhor com o candeeiro e a pose de escritor altivo, de pseudo-romancista de cómoda em pé. Mais foi assim que Pessoa escreveu muitos dos seus, não é?
Deixem-no estar que ele sonha.
Ah pobre Diabo, não sabe o que diz mas sorri, se é feliz, então a vida eu lhe gabo.
Chove e molha-se a roupa, chove e enchem-se as valetas de toda a merda que corre pela cidade, chove e solta-se o grito mudo dos céus arroxeados, carregados de uma frustração perene, de uma luta, que não de classes, que não é só deles.
Como cheira a terra.
Como a luz é pouca, mas vive em liberdade.
Deixa-te estar na cama Lisboa, é cedo, e quanto a nós, já te chega a tua própria infelicidade.
E o que é de mim que estou para aqui a chatear-te?!
Pouco mais tenho a fazer, resta-me contigo falar.
Se não for contigo, aos outros não sei o que digo, mais vale aproveitar.
Dorme bem pequena.
Que agora vou-me eu deitar.
Daqui a pouco estou de volta e tu, estarás sempre no teu lugar.

 

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