Era Sexta-feira. Mais uma outra sexta-feira ao acaso.
Manhã, de sol tímido, dia de almoço lá perto, bem perto, perto de mais.
E a Era em que hoje vivemos, da tecnologia suprema, da acessibilidade absoluta, permite que muitas vezes tenhamos conhecimento das coisas da vida, em locais e momentos que roçam o inusitado.
Assim foi no passado dia 10 de Maio, quando tomei conhecimento da morte de Bernardo Sassetti.
Sassetti foi de longe um dos grandes músicos que tive a oportunidade de escutar nos quase 29 anos que compõem a minha vida.
Ouvi-o, olhei-o, escutei-o e pensei-o como a parte mas também como o todo.
Sassetti foi um virtuoso na plenitude da virtude.
A música parecia ser para o Bernardo, um quadrante interno da sua alma, um ponto cardeal do seu pensamento.
E para estes iluminados a vida é tudo menos uma coisa estanque onde tudo termina e nada começa.
Criar e ser criativo, é na vida o significado maior do ser e e mais do que isso, do estar.
E tu Bernardo, tu, foste mestre, professor, ancião, letrado e iluminado, com o coração de quem vive apaixonado pelo encadear traumatizado, de colcheias, compassos, claves e cigarros em maços, copos virados e copos docemente pintados pela opacidade das cores que os enchem.
Como são distintos os homens que criam e vivem a vida da criação, bem colada ao bater do coração!Como são de longe esses... seres aprimorados.
Como nos chegam em difusas notas, severa e meticulosamente pensadas e alinhadas com a precisão dos génios, que têm na fineza da criatividade, o expoente máximo da própria genialidade, bem na extremidade das mãos, na ponta dos dedos, irrequietos e ordenados, comandados pela mestria e sumptuosidade da brilhante mente que possuem.
São Deuses de pequenas e tão grandes coisas.
São seres que limitam a vida à vida que querem viver, atrás da qual correm, loucos, varridos, lunáticos esses... artistas... perdidos.
A busca incessante pela perfeição e pela arte, em que parecia acreditar tão cegamente, quão cegos parecem ter sido os passos que deu em direcção ao abismo que o sugou, ele sim, assassino! levaram-no mais longe e... longe demais.
Do imperial ao imperioso, do virtual ao virtuoso, quão devastador e nefasto pode ser, o recordar nostálgico de alguém que partiu a quem mais não conhecemos do que o talento, o virtuosismo, a entrega em tom de entrevista ou na mais pura das formas, ao vivo, sentado atrás das infinitas notas de um piano a que dava vida e poder.
Tinha dito a mim mesmo uns meses antes que iria vê-lo tocar este ano, uma vez mais, fui tarde.
Mas o Bernardo deixou-nos a obra, a alma na obra, a música, as notas, o corpo e os sonhos nas mesmas, fez com que possa ser eterna a paixão dos que o ouvem pelo trabalho que fez.
Sim, por estes dias volta a euforia em torno dos 23 que procuram elevar o nome de Portugal mais alto, lá no cimo, os 23 de Paulo Bento, milionários sultões do futebol de hoje, com o expoente máximo mundial a envergar a camisola 7 da "nossa" equipa, carregam as Quinas ao peito, o símbolo da Nike no lado oposto e cantam o hino antes de começarem a trabalhar, porque há coisas que não mudam.
Em todo o caso, outros "trabalhadores virtuosos" como Sassetti, Carlos do Carmo, Camané, Mariza, Moonspell, Tiago Pires, entre outros, dedicam toda uma vida a representar o país, e nunca obtêm semelhante e muitas vezes condigno reconhecimento. Muitas vezes são eles os responsáveis pela vinda ao nosso país de milhares de turistas, que os ouvem, ou vêm no desempenho das suas funções e ganham uma imensa curiosidade por conhecer o local de onde vêm os Portugueses.
E estes muitas vezes só ouvem o hino se se "portarem bem", muito bem mesmo.
Precisamos seriamente de ajuda caramba, mas de mais do que isso temos de nos ajudar a nós mesmos.
Há quem acredite que "isto" não tem solução, nem melhoras a breve ou a médio prazo.
O que será de Portugal?
Será o que fizermos dele, bem como a vida é o que fazes dela.
Bernardo Sassetti, obrigado por seres Português, por também tu seres Portugal.
Todos o fossem, assim, um pouco mais como tu...
Todos e não só alguns, por na vida o que nos falta são os traços comuns.
No Bernardo, era particular a comunhão dos dedos com as teclas, as pretas e as brancas, os pedais, o banco, a cauda.
Foi-se um enorme músico, um virtuoso, ficou a sua música e o mundo só te pode agradecer,
Bernardo Sassetti.
Obrigado.
1970-2012
http://www.rtp.pt/noticias/index.php?article=552778&tm=4&layout=121&visual=49
http://www.youtube.com/watch?v=Fy2VkoCSJbc&feature=related
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